A síndrome do cérebro estragado
“Brainrot” e o jornalismo + Milton e a Musa + Jumenteu e as tardes de domingo
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Domingo, dia 14, sairá, às 07h09m, o nono capítulo do “Réquiem do Boi - Memórias Melódicas”.
No auge do entusiasmo pelas tecnologias digitais, ali pelo final dos anos 1980, sonhava-se com a democratização da informação e uma nova era do esclarecimento.
Saíram livros de intelectuais, como os do francês Paulo Virilio (1932-2018), maravilhados com os novos meios de comunicação, as infinitas possibilidades criativas das interfaces multimídias, os hiperlinks e o próprio futuro.
A internet varreria a ignorância da Terra.
Daríamos largos passos à frente na história humana — e não sei mais que tipo de devaneio floreado.
Vieram as redes sociais, chega a inteligência artificial generativa e estamos aí, ainda encantados.
Mas muitos de nós se cansaram do espetáculo pirotécnico e percebemos seu alto preço.
A conta de todo o show apresentada à humanidade não para de crescer.
Parafraseando o dramaturgo e jornalista vienense Karl Kraus (1874-1936) sobre a psicanálise, a internet foi tomada pela doença que pretendia curar.
A ordem algorítmica é fundo de um grande processo demencial de infantilização e naturalização do comportamento irracional.
Fortalece o egocentrismo, o autoritarismo e a expansão do extremismo.
Eleva a alturas vertiginosas o gosto pelo entretenimento vazio, a vulgaridade, a fofoca e a pornografia, gosto cevado, muito antes da internet, na chamada “civilização do espetáculo”.
Rebaixa padrões culturais e em grande medida destrói uma construção secular de formação humanística calcada no gozo da literatura, da música e das artes.
Não vou me repetir sobre as iniciativas de pais e autoridades para responsabilizar empresas de tecnologia por transtornos mentais sofridos por crianças e adolescentes nas redes sociais.
Mas o autoengano, como é notório, é uma avenida larga para o trânsito da medicalização da vida.
A cada fim de semana temos na praça uma dúzia de supostas novas patologias emocionais.
Algumas acabarão listadas no DSM, sigla em inglês para o manual psiquiátrico diagnóstico e estatístico de transtornos mentais.
Mas vejo que o tema é mais intricado do que me parecia.
Parece que chegou a vez da candidatura do “Brainrot” ao DSM?
Seria a ironia do milênio.
Percebi, ao ler o “Globo” online, onde mais?, que cresce o interesse pelo “distúrbio” que acometeria viciados em conteúdos “fúteis” (aspas do original) nas redes sociais e adjacências.
Fala-se em “Brainrot”, traduzido no Brasil por “cérebro podre” com a variante “podridão cerebral”, desde 2007, incialmente, me informo, como brincadeira, hoje a sério.
Eu sugiro uma tradução intermediária: “síndrome do cérebro estragado”.
Não fazia ideia de que a absorção pantagruélica de “conteúdos” rebaixados tinha uma classificação e era objeto de pesquisa.
Para mim era simplesmente a mais dura e plana realidade.
Em papo reto, o mal pegaria o freguês inveterado de lixo online.
Conforme “O Globo”, conteúdos “fúteis” incluem:
“(...) o consumo excessivo de redes sociais, programas de TV de baixa qualidade, memes e outros tipos de entretenimento que não oferecem valor educacional ou cultural significativo.”
Pergunta óbvia: o que sobra, então, o BBB?
Os sintomas do “distúrbio”, incluem, diz a “reportagem” (me perdoem a deselegância das aspas, inevitáveis aqui) “baixa capacidade de concentração, pensamento crítico e criatividade”.
Bem, nesse caso já está tudo dominado pelo “Brainrot”, a começar do próprio jornalismo que traz o problema.
E o que aconteceria com o cérebro da vítima dessa “podridão”? Se atrofiava, virava geleca, entrava em parafuso?
O jornal, infelizmente, não investiga muito, você sabe, no jornalismo online falam mais alto e gritam o aqui e agora, o número de cliques e as metas diárias de views alcançadas por cada “conteúdo”.
Nem se reporta a pesquisas nem ouve algum psiquiatra ou neurologista.
Ouviu, sim, uma única fonte, Gisele Hedler, “especialista em comportamento humano”.
Fiz uma breve pesquisa sobre a profissional.
Ela se apresenta no roçado da rede, em site pessoal, como “mentora e treinadora de seres humanos”, com a variação “especialista em desenvolvimento humano e pessoal”.
Em outra área, sabe-se que Hedler é
“Reconhecida por sua expertise em psicologia positiva e liderança da Tribo Vida®, um movimento que ajuda a ‘desligar os genes das doenças com ferramentas simples baseada em ciência’. Gisele é referência em estilo de vida saudável e transformação pessoal.”
Mais perguntas óbvias: baseada em que ciência? Que ferramentas simples?
E por fim: que jornalismo é esse, papai do céu, que faz de conta que não concorre com o que ele próprio define como conteúdo fútil, ainda que “fútil”?
*
Essa conversa sobre “Brainrot” a essa altura dos acontecimentos me lembrou o filme americano “Awakenings”, no Brasil “Tempo de Despertar” (1990), baseado no livro do neurologista Oliver Sacks (1933-2015).
Imagino uma variante epidêmica da “doença do sono” (encefalite letárgica) tratada nos dias atuais, como na fita dirigida por Penny Marshall (1943-2018).
Multidões adormecidas na década de 1970 começariam a acordar em 2024, graças a uma nova droga, como antes proporcionado pela L-DOPA.
Como terapia, enfermeiros ensinariam aos despertados a usar Iphones para se atualizarem sobre a vida enquanto dormiram.
Os pacientes iriam para o Google, entrariam nas redes sociais, no YouTube, dariam uma olhada na IA… e logo jogariam longe os aparelhos recebidos.
Todos chocados, assombrados, novamente tomados por uma incontrolável vontade de dormir.
Como aquele personagem de Jô Soares (1938-1922), o General, que permanece seis anos em coma e acorda com a ditadura já no retrovisor.
Quando, ainda hospital, o põem a par das novidades, o fim do governo Figueiredo, o primeiro presidente civil depois de 21 anos etc., o General solta o bordão “me tira o tubo”.
*
Se começam a falar sério em “Brainrot”, logo a OMS terá de emitir alertas sobre a disseminação pandêmica do distúrbio em proporções indizíveis e incuráveis.
Apenas criancinhas ainda inocentes poderiam se salvar, caso medidas radicais de reeducação dos pais fossem aplicadas massivamente.
Não é difícil prever que reverter o aquecimento global seria fichinha perto da possibilidade de se impor algum controle à pandemia de “Brainrot”, ou da “síndrome do cérebro estragado”.
*
Creio que grande parte do esforço de medicalização da vida se resolveria se a crítica cultural e o livre trânsito das ideias não houvessem sido jurados de morte pela decadência do pensamento humanista e do jornalismo — catalisada pelo patrulhamento ideológico.
MUSA MÚSICA
Leio sobre a aposentadoria dos palcos de Gilberto Gil, com turnê de despedida ano que vem, como foi a de Milton Nascimento, em 2022.
É um prêmio viver neste tempo e poder assistir à fruição da glória estendida de alguns dos maiores criadores da música popular.
Gil, Chico, Caetano, Milton, Paulinho da Viola, Edu Lobo, Francis Hime... e outros oitentões na ativa.
A arte deles representa, com rigor e fidelidade, mais de um século de invenção musical e formação social e cultural do país — uma inestimável composição de vivências e memórias.
Representa Pixinguinha, Caymmi, Vinicius, Assis Valente, Ary Barroso, Noel, Ismael, Ataulfo, João Gilberto, Tom Jobim, Carlos Lyra e as Plêiades formadas por compositores, cantores e instrumentistas de grande valor.
Quantas gerações, mais ou menos contemporâneas, eles ainda conectam na comunhão histórica entre África e Europa, entre a polca e a mazurca e o lundu e a modinha, além de outros gêneros, desde o batismo do choro?
Somos plateia de um espetáculo incomum e original, ao poder acompanhar a despedida da geração nascida nos anos 1940.
Se fossem americanos, já teriam os obituários prontos no “The New York Times”.
E nós brindamos à saúde de todos.
Gil e Milton continuam a compor e gravar; vem aí novo livro de Chico, “Bambino a Roma” (em pré-venda), e uma nova turnê de Caetano e Maria Bethânia.
É uma história bonita. Me sinto distinguido neste público.
*
Quero me deter um pouco na fascinante história de Milton, na sua própria existência.
Sua vida seria melhor contada com ajuda de alguma metafísica, ou uma mãozinha dos mitos.
Penso muito em Bituca.
O álbum duplo “Clube da Esquina” (1972) foi, há pouco, mais uma vez celebrado, agora nos EUA, como um dos melhores de todos os tempos.
O fato transcende a fragilidade de listas e rankings, que não têm grande importância.
Mesmo nossas eleições pessoais são ajustadas com o passar do tempo, exceto, talvez, o núcleo duro da trilha sonora de cada um — graças às elevações emocionais fixadas na adolescência por paixões e cismas constelares.
O mais relevante é que o “Clube da Esquina” semeou e semeia, há mais de meio século, invenção e beleza.
A história desse disco não tem paralelo no país, quiçá no mundo, pois guarda um equilíbrio, para mim ideal, entre artesania e indústria e entre criatividade e rigor profissional.
E sua realização se deveu inteiramente à vontade de Bituca, à autoconsciência de sua singularidade artística, bem como à ética pessoal guiada pela amizade.
Milton ainda é uma grandeza imponderada, situada em alguma dimensão desconhecida, e o fato de ser um brasileiro preto embaralha narrativas.
Ele é uma pluralidade de emoções e movimentos simultâneos; é a música encarnada.
Me pergunto, com a imaginação à solta, se a sua existência não teve a intervenção das Musas Primordiais, filhas de Zeus e Mnemosine, num sobrevoo pelo Rio.
Música, não custa recordar, vem “do que diz respeito às musas” (do grego mousiké), e nove musas foram geradas pra celebrar as memórias dos deuses.
Quem sabe uma delas, Euterpe, que é do ramo, não se meteu no destino de Milton, nascido negro e pobre num país mestiço e miserável.
(Será, por falar nisso, que nosso tempo, tão informático e pragmático, merece favores de Euterpe, ou o feito de Hermes, criador da primeira lira?)
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A história é conhecida mas merece uma lembrança aqui.
Milton é filho de Maria do Carmo do Nascimento, Carminha (1918-1944), empregada doméstica e mãe solteira.
Carminha morreu de tuberculose antes de o menino completar dois anos.
Era empregada da pensão de Augusta e Edgar de Carvalho e Silva, na rua Conde de Bonfim, 472, na Tijuca, Rio de Janeiro. Ali nasceu Milton.
A filha de Augusta, Lília Silva Campos, que não podia gerar filhos, apega-se à criança, que tratariam por Bituca; ela e o marido, Josino Campos, vão adotar Milton Silva Campos Nascimento.
Lília, estudante de piano, se torna professora de música.
“A adoção de Milton é uma coisa linda. Não teve nenhum problema. Sem papel ou juíza. Quantos Milton Nascimento não estariam perdidos por causa de burocracia de adoção? A dele foi supertranquila", disse Vilma Nascimento ao repórter Cláudio Leal, da “Folha de S.Paulo”.
Vilma é prima do artista e coautora do livro “De Onde Vem Essa Força: Histórias da Família de Nascimento para o Mundo” (editora Letramento), com os jornalistas pesquisadores Jary Cardoso e João Marcos Veiga.
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Milton deu o nome da segunda mãe a um tema instrumental recheado de vocalizes, registrado no “Clube da Esquina” e por vários intérpretes, entre eles Wayne Shorter, Anat Cohen e João Bosco.
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Em “Raça” (com Fernando Brant), Milton celebra sua descendência e o que o país tem de glorioso.
Tenho a canção, do disco “Missa dos Quilombos” (1982), como sucedâneo do hino nacional, nosso dobrado esquisitão.
A letra termina com a invocação de ícones de cultura negra, incluindo avó Maria, prima Vilma e tia Ercília.
“É Clementina cantando bonito
As aventuras do seu povo aflito
É Seu Francisco, boné e cachimbo
Me ensinando que a luta é mesmo comigo
Todas Marias, Maria Dominga
Atraca Vilma e Tia Ercília
É Monsueto e é Grande Otelo
Atraca, atraca que o Naná vem chegando”
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Do Rio para Três Pontas, onde conhece Wagner Tiso, depois o Belo.
Milton amplia laços familiares, convive com os Borges — gente de Lô e Marcio, parceiros de vida — vizinhos da mítica esquina de Santa Tereza, e Fernando Brant (1944-2015).
Depois vai conquistar o mundo sem mover um milímetro suas raízes.
O resto é música.
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O entrevistei, ou tentei entrevistar, uma vez, em meus primeiros anos de jornalismo.
Foi em 8 de abril de 1992, ele lançava “O Planeta Blue na Estrada no Sol”, LP de um dos primeiros shows acústicos, gravado no ano anterior.
Entre as onze faixas, o álbum traz canções suas, de Caetano (“Um Índio”), Chico (“Beatriz”, com Edu Lobo), Tom Jobim (“Estrada do Sol”, com Dolores Duran) e uma versão falseteada de “Hello, Goodbye” (Lennon & MacCartney) .
Me lembro de o assessor de imprensa me conceder 15 ou 20 minutos a sós com o ídolo, ao lado da piscina de um hotel do Belo.
Não devo ter anotado mais que meia dúzia de frases descontínuas.
Milton é cem por cento coração, de pouca prosa e cismado com o que não é amizade visceral.
A despeito de ter nascido no Rio, é o maior mineiro do planeta.
Nem eu nem ele, entrevistador e entrevistado, podíamos operar o milagre de estabelecer alguma troca relevante naquele quarto de hora.
Nem ele se aprofundar sobre o novo álbum, nem eu no questionário para a matéria de apresentação do trabalho aos leitores do “Hoje em Dia”.
Trouxe um autógrafo no vinil promocional, que obviamente ainda guardo.
Mais importante: ouvi sua voz, olhei nos seus olhos, privei rapidamente de uma entidade, uma espécie magnífica de artista.
JUMENTEU E A ESCURIDÃO
Chego à redação do Escrevidas para dar tratos à bola, um tanto dividida com meu humor cinzento.
Se o equilíbrio é precário, devagar com o andor.
É tarde de domingo, já viu.
Tarde nem tão jovem quanto aquelas da nostálgica canção da dupla Roberto-Erasmo, que está para nós como Lennon-MacCartney para a “pérfida Albion”.
Pérfida Albion?
Com esse epíteto um diplomata e poeta francês tascou a Grã-Bretanha (Albion de “albião”, antiga denominação grega para a Inglaterra); e a expressão, como não se diria então, viralizou.
Entre os refolhos da carolina, que se debruça sobre minha sacada, já é noite ——— logo adiada pela aurora nas plumas de um inopinado bem-te-vi.
Assim se entra na noite, a buscar um prenúncio do dia.
A carolina, por sinal, segue a abrir flores esparsas, como de surpresa, na misteriosa cadência dessa árvore, que parece, secretamente, terçar ponto e contraponto.
Ela frutifica, floresce e “desfrutifica” ao mesmo tempo.
Nem tudo é pântano e negror nessa noite precoce de inverno.
A direita radical foi barrada na França.
Se a derrota de Mariane Le Pen é revés para Vladimir Putin, Viktor Orbán, Donald Trump e o bando todo, para a extensa humanidade que a França ajudou a educar o resultado dessas eleições é um gole de champagne.
E o Cruzeiro vai cocando o Corinthians.
Com um olho na Europa outro no Mineirão, passeio por meus arquivos digitais e deparo a assombração do inacabado “Diários de um Asno Ruminante”.
Recomendo a novos leitores — desde já queridas e queridos— que espiem o Escrevidas de fevereiro “Me chame de Jumenteu”.
Talvez sirva a quem pretende saber quem eu sou, ou não sou, não sei, tentei ser claro ali.
Como não temo mula sem cabeça, abro os originais do Jumenteu, que pretendia esquecidos.
Logo encontro esta entrada, de 3 de agosto:
“Empaquei numa telessérie adocicada sobre os apuros do casal real norueguês na Segunda Guerra. O nome da xanguana é “Atlantic Crossing” .
A história tem personagens britânicos e americanos, como o ex-presidente Roosevelt e sua mulher, Eleonor.
FDR é feito pelo agente especial do FBI Dale Cooper, de “Twin Peaks” — como esquecer? — o ator Kyle MacLachlan.
E a consorte do príncipe norueguês pela cultuada Sofia Margareta Götschenhjelm Helin, a detetive autista de “A Ponte”.
Entrei pela madrugada embalado no xarope nórdico, seduzido pelas imagens geladas de montanhas de neve, pinheiros brancos e água, muita água — lagos, rios, mares.
As imagens da abertura começam com a formação de um floco de neve.
Um floco de neve, minúsculo cristal hexagonal, como mostrou Johannes Kepler, guarda estruturas do universo, a forma de todas as coisas, de plantas a galáxias espirais.
—
É um cenário relaxante, faz frio também por aqui; um uisquinho e um cobertor no sofá compõem a cena.
—
Mas já me perco nessa entrada, aberta para registrar o que me veio à telha ao ver a abertura de “Atlantic Crossing”.
Podia ser uma iluminação, fosse um Rimbaud, não um asno que rumina.
Mas era uma ideia clara do que somos.
O que somos? Corpos, corpos confundidos pela consciência, duvidosa dádiva evolutiva que nos fez humanos e bem... está tudo na internet.
A consciência de que somos bichos, finitos, e guardamos em cada célula toda uma epopeia, milhões de anos de apuração genética, com absurda diversidade da vida.
Somos um veículo errante e fugaz.
Foi o que nos meteu em ilhas de fantasia — religião, arte, mitologias, história — banhadas de cinismo e crueldade por todos os lados.
Como nesta história da moça no noticiário.
Embriagada, talvez perto do coma, abandonada por um motorista de Uber acéfalo recostada a um poste em frente ao seu prédio periférico — ele, o motorista, foge, ela cai no passeio;
Expelido do fundo do inferno como um carnicão, vem o predador, a Coisa;
A Coisa joga a moça nos ombros, como um chapa de caminhão um saco de arroz, como um catador de lixo reciclável sua recolha noturna;
A Coisa leva a presa a um campo de futebol a três quilômetros distante e a submete a sevícias durante longas horas.
Donde a dúvida nuclear, ideia tão humana, que não escapa sequer aos ateus, e gira in saecula saeculorum.
A incompatibilidade entre a bondade divina e a dor humana em certo grau.
Me recorda Scobie, o anti-herói suicida de Graham Greene em “O Cerne da Questão”, com seu catolicismo parasitário.
Relacionar a crença na bondade de Deus com o estranho, ou nem tão estranho infortúnio dessa moça, é uma viagem dentro da noite mais escura.
Ela foi descartada na rua refeita em selva, deixada à mercê de feras famintas que caçam na metrópole a altas horas.
Como se sabe, na selva urbana não faltam leões, hienas, dinossauros.
—
Qual a diferença?
Bato na madeira, Jumenteu é barra pesada, um anticlimático, um divisor de águas, um poço escuro, um pra baixo.
Procuro esquecer sua aparição e o livro inacabado.
Tento me fixar na goleada do Cabuloso no “Timão” e na união nacional francesa contra madame le Pen.
Talvez um gole de champanhe. E uma canção de Milton.
*
Por ora é isso, acho. Salve, saravá e abraçaço!